terça-feira, 22 de janeiro de 2008

AS BRUXAS... E SEUS LOBOS

RESENHA
Ernani Xavier


A EPIDEMIA DA ROTINA
“As bruxas ... e os seus lobos” é um romance policial, mas só de fachada. Na realidade é uma crítica social bem construída, esta estréia de George Patrão no campo da literatura. Na história tem assassinos que são super familiares a cada um de nós, vivem em nossa companhia, e eles são bem identificados desde o início, não obstante continue este e outros suspenses durante todo o texto. Reúne em sua malha extensa, figuras bem comuns a todo o leitor: bruxas, policiais, chás medicinais, veneno, poções mágicas, além de sentimentos bem corriqueiros de medo, amor, ódio, coragem, mas nem tanto... Outros ingredientes do texto não podiam faltar: vassouras, sem o que não dá para falar em bruxas e facas para ilustrar assassinatos, rituais cruéis. Ah! estava esquecendo: policiais. Tudo cingido em uma linguagem esplendorosa. O texto trata de uma patologia social chamada pelo autor de normose. As personagens são duas bruxas, a Celene e a Lilibeth. São funcionárias de um supermercado enorme. O policial Jonas tem de investigar um assassinato. Uma das bruxas é culpada a outra inocente. Daí em diante segue o enredo. Claro que têm surpresas incríveis. O personagem Jonas tem a ver com o Jonas bíblico. Teimoso, resistente. É vomitado pela baleia. Sobrevive, pois tem uma missão que lhe deram. A bruxa Lilibeth vem de várias encarnações, trás heranças de todas, mostra-se intolerantemente teimosa ás vezes... “Nós, as autogeradas, somos a verdadeira essência da raça. Vocês humanos, bruxas ou não, são passageiros. Só nós é que contamos de verdade. É para nós que o sol brilha. E ele brilha o nosso brilho!”. A bruxa Celene exerce um papel de curandeiro. Tem poderes. Manifesta-se através do “encontro”. Um dos primeiros resultados deste poder surge no encontro com Jonas. Este vai aos poucos assumindo o seu valor como ser humano, pois, procura estar cada vez mais, “fora do normal”. Vai abandonando as normalidades. Os encontros vão exercendo papéis mais e mais terapêuticos conforme revele o enredo. Celene vai promovendo mudanças nos demais personagens ao combater a doença da normose. Após a ocorrência de um crime, o policial Jonas é chamado e sai em busca da principal suspeita, Celene. Esse encontro precipita uma simbiose entre os dois passam a procurar a verdadeira responsável pelo crime e, ao mesmo tempo, iniciam uma formidável viagem interna de autodescobrimento. O pragmatismo e a incredulidade de Jonas serão postos à prova diante da sabedoria mística de sua companheira de viagem, uma mulher de muitos e grandes segredos. Há uma curiosidade para saber qual é, afinal, a verdadeira missão da “bruxa má”, a Lilibeth na seqüência do texto... O texto trás a rotina do ambiente em que tudo ocorre, o supermercado: “Bem, há as patinadoras. Todas elas jovens, leves em suas botas com rodas, abastecendo os caixas com troco e sacos plásticos ou levando cheques para autorização. Sem parar, sem parar. Tanto exercício tem suas vantagens: belas pernas. Todas, sem exceção, as possuem. Até uma ou outra mais feinha de rosto, se observada sob outro ângulo, fica muito interessante”. O romance foi ambientado em locais comuns e retrata a beleza das coisas simples, que na maioria das vezes é deixada de lado. “A magia da vida se encontra nos pequenos detalhes, tais como a preparação de uma xícara de chá a um sonho, nos movimentos de um golfinho às sabias palavras de um humilde pescador”, comenta o autor. George Patrão é consultor e estudante de Holística de Base pela Universidade da Paz, mestre Reiki e bacharel em Ciências Políticas. Faz literatura e bem, por diletantismo. O seu trabalho é uma contestação á doença social a que ele trata ironicamente de normose, para combinar com outra muito comum a neurose. A sociedade, segundo o autor acomoda-se nas suas normalidades, embota assim a criatividade, anula a crítica e a autocrítica. As pessoas, acometidas pela normose crônica, nascem, vivem e morrem venerando os seus mitos, que são hábitos e convenções e fecham-se ao novo.
George Patrão. “As Bruxas... E Seus Lobos”, São Paulo: Limiar, 2005. 247 pp.
http://planetalivros.blogspot.com/
PALAVRA-CHAVE
resistência á mudança, apego á rotina, medo de ousar, normose

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