domingo, 27 de janeiro de 2008

PAULA

RESENHA
Ernani Xavier

O VIGOR DA VIDA
Isabel Allende relata o drama de sua filha Paula, que dá título ao livro, na esperança de que ela venha a ler o que escreveu, tão logo se recobre do estado de coma em que se encontra. Expressa o seu sofrimento maternal juntando flashbacks da sua vida pessoal como, alegrias, tristezas, amores e desilusões, com impressionante realidade. É um terno testemunho contado na primeira pessoa. Na realidade é uma história que culmina com a morte, não sendo, entretanto, um livro que se dedique a este tema. Mais do que tudo é uma celebração da vida. (...) “A sua longa agonia deu-me a oportunidade única de rever o meu passado”. Um documento autobiográfico, com forte poder catártico e a tentativa de superação para a profunda agonia, pondo no papel as recordações, na tentativa de que o tempo não as consuma. Contando o drama da filha conta a história da sua própria família, pais infância, desgostos, crenças... Talvez porque, como diz, "toda a ficção é, em última análise, autobiográfica. Escrevo sobre amor e violência, sobre morte e salvação, sobre mulheres fortes e pais ausentes, sobre sobrevivência". A escritora queria que a sua filha não perdesse a conexão da sua consciência e a sua memória ao se despertar. Mas, a doença de Paula, de causa hereditária, lhe causou a morte no mês de dezembro de 1992, com apenas 29 anos de idade. O resultado é uma peça literária de forte personalidade. Como um exorcismo da morte e, ao mesmo tempo, uma celebração da vida, o texto explora o passado, questiona os deuses do destino conduzindo o leitor de lágrimas ao riso, do terror á sensualidade. Revela a vida cheia de cores da sua filha, ao mesmo tempo em que trás à superfície fatos que lembram sua infância no Chile, onde nasceu, os terrores do golpe militar de 1973, a odienta ditadura subseqüente, e as experiências no exílio. Combina duas qualidades expressivas da ficção: a densidade e a intensidade. “É tanto um diálogo à cabeceira de uma doente clinicamente privada de consciência, como um solilóquio de grandeza e fragilidade, a tentativa de unir a idéia do amor como única ponte de salvação humana, a realidade do sofrimento tantas vezes absurdo e indecoroso”. Para a autora, «Paula foi uma catarse, um exorcismo. A minha filha morreu a 6 de Dezembro de 1992 e um mês depois, a 8 de Janeiro, tinha que começar a escrever um novo livro. Só que não estava em condições de o fazer. Sentia-me muito em baixo e muito cansada”. Encontrou na escrita, mesmo que não intencionalmente, um lenitivo para não mergulhar em séria depressão e possivelmente no suicídio. Colocou toda a sua energia possível e transbordou toda a sua emocionalidade possível na história. Sublimou a dor e o sofrimento, sem, contudo, perder o senso de humor, a ternura e o equilíbrio da sua mente criativa na obra. Com a fortaleza da mulher chilena, ou de uma mulher chilena, ela se sobrepõe a si mesma, supera a dor, a angustia e o medo, o desgaste psíquico que tudo lhe produziu (exílio, divórcio, morte de uma filha) na angustiante caminhada e constrói uma obra prima que invade o coração de quem a lê e que demonstra que o amor pode muito bem ser o recurso mais precioso para se continuar vivendo.

Isabel Allende, Paula Editora Bertrand Brasil. 1996, 472 páginas.
Palavras-chave: laços familiares, adoecimento, morte, vida
http://planetalivros.blogspot.com/

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