domingo, 20 de janeiro de 2008

EU SEI QUE VOU TE AMAR

CÔNICA DO DESAMOR

A ficção romanceada de Arnaldo Jabor “Eu sei que vou te amar” desnuda o âmago de duas personalidades marcadas pelo sentimento do desamor. No seu íntimo pensa ela: “Não te vejo há três meses ... seis anos juntos e agora sem te ver... pela tua voz no telefone sei que você está controlando uma emoção, querendo bancar o homem seguro de si. E ele: “Acho que ela conseguiu... não me ama mais, me superou... melhor assim, fico mais livre... sorriso calmo... me esqueceu, dancei, ótimo, chega de inferno... dois adultos...”
No re-encontro sem a intenção de litígio acaba por acontecer o que há de mais óbvio previsível: queixas e antigos ressentimentos são virados e revirados numa tentativa de justificar que a separação foi a melhor escolha e que o grande culpado de do final foi o outro. Revelações foram emergindo. Ela nutria um amor por outro. Ele a teria traído para compensar a sua indiferença.
Quanto mais conteúdo é trazido á discussão ansiosa e angustiante vai mostrando a real identidade de cada um num processo maravilhosamente catártico e fortemente revelador das verdades de cada um.
- “É... esse negócio de casamento não dá mais pé: instituição pesada... antigamente ainda tinha a família patriarcal... os pais na mesa... a amante no bordel... hoje em dia a única finalidade do casamento é a repressão sexual do parceiro... só isso...
- Claro... estou muito mais desinibida... este problema de repressão sexual não tenho mais...
- Não???
- Nada... nadinha!... Sei que posso transar com qualquer cara que me der vontade que não sinto culpa... tem sido ótimo... tenho tido experiências sexuais ótimas...”
O diálogo tenso move-se de mentiras polidas a verdades duras de aceitar, surpresas, questionamentos, arrependimentos e delírios. No embate emocional ele não resiste ao desejo e movimenta-se para realiza-lo. Ela resiste embora dê sinais de reciprocidade. Um gás que ela usou para imobiliza-lo possuindo efeito alucinante e os leva ao delírio. Acabam por se amar desvairadamente em mio a uma cena de desorganização completa do ambiente físico e emocional.
A sociedade matrimonial que reflete a sociedade comum onde todos vivemos é que vai sendo revelada na intimidade dos seus detalhes como, hipocrisia, mentiras, submissão, deslealdade e até falsa compaixão.
No seu texto Jabor faz a psicanálise do desamor. Na sua concepção o amor nasce dentro de cada um de nós. Através daquilo que nós construímos, dos nossos desejos, das nossas convicções que projetamos no outro. Igualmente morre dentro de cada um de nós, quando a realidade substitui a ilusão e desconstrói o nosso raciocínio sobre o outro.Construímos e (dês) construímos o que queremos no outro sem que este outro tenha a mínima noção disso.
O amor, portanto, na ficção de Jabor, é a nossa cotidiana ficção. É isso que se aprende e deprende da imensa originalidade de “Eu sei que vou te amar” de Arnaldo jabor.

Arnaldo Jabor. Eu sei que vou te amar. Rio: Objetiva, 2007.

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