domingo, 20 de janeiro de 2008
O HOMEM QUE NÃO GOSTAVA DE BEIJOS
ELÉGIAS AO ANTI-HEROISMO
É um livro de contos. Tem, entretanto, um protagonista principal. Muda muito. De sexo, de épocas, de forma, de cor. Pode ser um velho: no conto, “A carne”, o cavalheiro mais idoso, já meio parksoniano, sai de casa para ir ao açougue. Finaliza se identificando assim: “Meu nome é Horace Catskill, minhas veias e principais artérias são o mais completo caos”. No conto, “A vaca”, um personagem banguela, sente tendências irresistível à pedofilia. Em, “Os poemas” um professor se complica, pois, suas estratégias sedutoras o traíram e irritou suas alunas, elas chamam a polícia e o cara vai em cana. De contos em contos, ou de pedaços em pedaços, os engraçados e esquisitos personagens incorporados pelo protagonista Horace Catskill vão surpreendendo e divertindo. Já na apresentação se lê:... “Edward Pimenta experimenta com a escrita de forma lúdica, grotesca, lindamente erótica (nunca sendo vulgar), manipulando a linguagem como os melhores autores, e nos leva àquele lugar em que estamos quando estamos sós e nos checamos sós diante da finitude do universo: sozinhos diante de nós mesmos, com uma imagem vaga de quem e do que nós somos”. Com uma prosa fluente e natural o texto desliza sobre um elenco de tipos de esquisitos anti-heróis. A linguagem do autor é clara, mas sem sutilezas. Em lugar disso, uma tremenda criatividade de tons e corres e formas que impressionam. Assim, um pedaço do texto: “Não seria preciso relatar essa atroz limitação –minhas palavras não ensejam nuanças mais verossímeis--, não fosse o senso de responsabilidade que anda me oprimindo; há tempos tenho pensado em apagá-las da memória. Mas sucede que a morte desta mulher de noventa anos ocorreu naturalmente, como se havia de supor naquele verão, perturbando uma ordem inatural de coisas. Mãe de minha mãe, lembro de vagos cafunés por ela desempenhados burocraticamente, e as gemadas, um pó-de-arroz onipresente, suas orelhas brancas de velha com brincos vaidosos, um sistema circulatório-tegumentar frágil como nata de leite”. Pimenta brinca com o texto. Não usa clichês moralistas. Chama a atenção pela inventividade de tipos do seu único personagem. Pelas inúmeras e surpreendentes composições dos seus tipos. Diverte. Um escritor bem brasileiro, com todos os ingredientes de sucesso de venda. Necessita, entretanto de mais suporte da grande mídia, não obstante seja proveniente do meio. Estava na hora de aparecer alguém que fuja dos padrões de textos quadrados, retilíneos ou prenhes de falso moralismo. Pimenta rompe corajosamente muitas barreiras, portanto. Atinge os propósitos de uma literatura lúcida e lúdica. Prazerosa. Edward Pimenta é jornalista dos bons, nascido no interior de São Paulo, excelente humorista, prosador talentoso e ser humano cosmopolita por excelência.
Edward Pimenta. O homem que não gostava de beijos. Rio: Record, 2006. 128 pp.
http://planetalivros.blogspot.com/
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